Marco legal atrasa e “emperra” litoral

Três documentos de responsabilidade do governo estadual e que servem de base para a criação e revisão dos planos diretores das sete cidades do litoral do Paraná estão demorando a sair. Prometidos há anos e por diferentes governos, esses documentos são fundamentais porque definem, afinal, o que pode ou não ser área industrial.Em uma região que é uma colcha de retalhos de áreas de preservação mas precisa encontrar alternativas ao turismo de verão, instrumentos assim facilitam a atração de investimentos e evitam impasses como o da Subsea 7. A empresa norueguesa de engenharia submarina comprou uma área em Pontal do Paraná em 2007, mas teve de desistir do investimento depois que o Instituto Ambiental do Paraná (IAP) cancelou a licença prévia em razão da fragilidade da área, que é de Mata Atlântica.

Plano alarga horizontes de Paranaguá

Segundo informações preliminares da Appa, o Pla­­no de Desenvolvimento e Zoneamento do Porto Or­­ganizado (PDZPO) de Paranaguá identificou 50 milhões de metros quadrados disponíveis para crescimento da área e retroárea do terminal, mantendo 80% da área da baía preservada. Segundo a autarquia, o documento dará origem ao maior plano de arrendamento portuário do país.
Um arquivo publicado no site do Conselho de Autoridade Portuária (CAP) dá alguma ideia do que se pretende em Paranaguá, com a indicação do bairro Rocio, por exemplo, como um dos afetados pela expansão do terminal. Ele fica na extremidade oeste do porto, que deverá ser destinada à atracação de navios de passageiros.

O documento também indica que o centro administrativo da Appa dará lugar a mais empresas e será instalado em um novo prédio “para abrigar também escritórios e representações da comunidade portuária, dos órgãos públicos que intervém na atividade portuária, restaurantes, auditório e centro de formação profissional, todos cedidos em forma de aluguel/arrendamento”. O PDZPO ainda reforça a necessidade de se aprofundar o canal e áreas de fundeio de navios para 17 metros.

Programa do governo não sai do lugar
Com as bases lançadas ainda em dezembro de 2010 por um decreto do então governador Orlando Pessuti e incorporado por Beto Richa, o programa Pontal do Pré-Sal, que prevê uma série de vantagens para empresas de desenvolvimento de navios, plataformas e equipamentos pesados, chega à metade do segundo ano do governo Richa sem deslanchar. À exceção da italiana Techint, nenhuma outra empresa da atividade se fixou no Paraná.

Um dos principais entraves é justamente a falta de legislação apropriada que dê segurança jurídica aos investimentos. O regime fiscal especial, que, por enquanto, é basicamente o que forma o programa, inclui suspensão do ICMS na importação de máquinas e na venda de mercadorias e a postergação do tributo na compra de bens. Para usufruir dessas vantagens, as empresas teriam de iniciar as obras em até seis meses a partir da emissão da licença de instalação e começar a funcionar até dois anos após a licença de operação. Outra exigência – que talvez seja revista pelo governo – é de que as empresas gerem ao menos 2 mil empregos diretos.

O primeiro documento travado, sob a responsabilidade das secretarias estaduais de Meio Ambiente e Planejamento, é o Zoneamento Econômico Ecológico do litoral. O ZEE tem como finalidade orientar os planos diretores das cidades que ainda não têm a normativa (Matinhos, Morretes, Pontal do Paraná e Guaratuba) e também a revisão daquelas que precisam aprimorá-la (Antonina, Paranaguá e Guaraqueçaba).
O zoneamento indicará que áreas podem ter atividade portuária ou industrial, as que precisam ser preservadas e as que não devem servir de moradia pelos riscos ambientais. Instituído no Brasil em 1991, o ZEE começou a ser discutido no Paraná em 1995, mas a comissão que realmente começou o trabalho foi formada apenas em 2010.

Segundo o secretário estadual de Meio Ambiente, Jonel Iurk, a redação do ZEE está pronta, mas passará por audiências públicas a partir de julho para então seguir à Assembleia Legislativa. Só depois de aprovado e sancionado é que poderá se consolidar como o marco regulatório para a ocupação do litoral.

“Hoje o litoral tem praticamente 82% do seu território constituído de unidades de conservação, portanto de uso bastante restrito, e pouco mais de 17% destinado ao desenvolvimento econômico. O ZEE vai definir, de uma vez por todas, aquelas que podem ser regularizadas e aquelas que deverão ser recuperadas e permanecer intocadas.”

Portos

Os outros dois documentos que emperram a atração de investimentos ao litoral são os planos de Desenvolvimento e Zoneamento do Porto Or­­ganizado (PDZPO) de Para­­naguá e de Antonina – ambos de responsabilidade da Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina, a Appa. O de Paranaguá teve o relatório final entregue em 25 de maio ao Conselho de Autoridade Portuária (CAP) de Paranaguá e terá de ser aprovado também pela Secretaria dos Portos (SEP) e Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq). A expectativa é que isso leve até 60 dias.
O de Antonina começou a ser feito só agora. O PDZPO define que espaço da área portuária está disponível para a instalação de empresas e prevê as condições de expansão do terminal. Deveria ser atualizado a cada cinco anos, mas a última revisão do de Paranaguá é de 2002. Próximo de Rio e São Paulo, o Paraná tem grande potencial para se tornar um polo de serviços e manutenção para a indústria naval e offshore.

A área portuária de Antonina e seu entorno tem gerado conflitos entre a prefeitura e a iniciativa privada antes mesmo de ter sua esperada retomada. Duas intervenções recentes foram o chamariz para a disputa: a obra de asfaltamento e interligação das avenidas Conde Matarazzo e Tiago Peixoto, que dão acesso ao Porto de Antonina; e a tentativa de construção de um barracão da Fortesolo em uma área residencial.

No primeiro caso, um dos herdeiros da família Matarazzo – dona do complexo industrial centenário que fica ao lado do terminal público de Barão de Teffé e também da única ferrovia particular do país e que passa paralela à Avenida – entrou com uma ação contra a prefeitura para que a obra, custeada com dinheiro da Transpetro, seja embargada.

A estrada de ferro, desativada desde os anos 1970, é a grande esperança de volta aos negócios da família Matarazzo. A América Latina Logística (ALL) já teve o aval dos herdeiros para utilizar a concessão ferroviária. “A concessão segue até 2017 e deve ser renovada. Tanto eu quanto minha mãe já oferecemos a ferrovia para a ALL”, explica Fernando Matarazzo, herdeiro das propriedades da família junto com a mãe, Eneida. O problema é que discordâncias entre mãe e filho emperram a herança há mais de dez anos.

Assim como o herdeiro Matarazzo, a ALL protocolou, na semana retrasada, uma ação na Vara Federal de Paranaguá contra a prefeitura também pedindo a interrupção da reforma da Avenida Conde Matarazzo. A empresa quer que o projeto seja adequado aos planos de reativação da linha.

Pelo projeto atual, uma ciclovia correria ao lado da linha férrea, algo bastante criticado pela população local, já que duas das principais escolas do município ficam na via, além de uma unidade da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae).

Outro conflito é a construção de um barracão da Fortesolo em um dos bairros residenciais da cidade. A empresa é ligada à Equiplan Consultoria Empresarial, que, em 2009, comprou 58,81% das ações do Terminal Ponta do Félix pertencentes aos fundos de pensão Previ e Funbep. A Fortesolo iniciou, no fim de 2011, a construção de um barracão na Avenida Tiago Peixoto, no bairro Barigui, ainda considerado residencial pelo Plano Diretor da cidade. Moradores alegam que a administração municipal tentou alterar a legislação durante a construção para beneficiar a empresa.

Acatada pelo juiz local e deferida parcialmente pelo Tribunal de Justiça do Paraná, uma liminar movida por Fernando Matarazzo interrompeu a obra.