Governo turbina PAC com obras já anunciadas

O "novo" Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), recalibrado pelo governo para estimular a economia brasileira em tempos de crise, terá R$ 646 bilhões até o fim do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e R$ 1,148 trilhão quando incluídos os investimentos que maturam após 2010. Mas o efeito propulsor do anúncio deverá ser limitado. Boa parte das obras e projetos contabilizados ontem já era amplamente esperada pelo setor privado e havia aparecido em balanços anteriores do PAC – sem relação direta com a crise. É o caso do piloto de produção de petróleo no campo de Tupi, do trem de alta velocidade Rio-São Paulo-Campinas e da ampliação do Luz para Todos. No total, o governo engordou o PAC em R$ 455 bilhões, dos quais R$ 142 bilhões ainda no governo Lula.Com a presença de 12 ministros, maior audiência desde o lançamento do PAC há dois anos, esse balanço teve caráter político mais forte do que qualquer outro. A ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, fez diversas comparações entre o governo Lula e a gestão tucana. "No passado, o Brasil quebrou e recorreu ao FMI. E a primeira recomendação era: suspendam os investimentos", disse Dilma, numa referência evidente, embora não tenha mencionado diretamente o PSDB. "O governo não está parado, não está inerte como ficava", provocou.

Em contraposição à postura adotada pelos governos anteriores, a ministra repetiu várias vezes que o PAC "não é uma mera lista de obras nem peça de marketing", mas um "projeto de desenvolvimento para o Brasil". Ao lembrar que uma parcela importante dos projetos será concluída apenas depois de 2010, como novas refinarias e usinas hidrelétricas, Dilma afirmou que o governo "vai querer muito ter um candidato que garanta a manutenção do nível de investimentos no país". Uma jornalista insistiu para ela responder se desejava ser presidente da República. "Minha querida, você não tira essa resposta de mim nem amarrada", disse Dilma, arrancando risos da platéia e dos colegas ministros.

A chefe da Casa Civil, no entanto, deu seguidas alfinetadas nos governos tucanos. Apresentou, por exemplo, uma planilha em que comparava pedágios de rodovias federais e do Estado de São Paulo. Enquanto a tarifa média do último leilão federal foi de R$ 1,98 para cada 100 quilômetros concedidos, as estradas paulistas privatizadas em 1997/98 (gestão Mário Covas) tiveram tarifa média de R$ 9,30 e aquelas licitadas no ano passado (gestão José Serra) alcançaram R$ 6,85.

As comparações englobaram também o setor de ferrovias. Para a ministra, as concessionárias só operam no limite de suas malhas, comprometendo o atendimento ao mercado e a competitividade na oferta de serviços. Dilma sinalizou com mudanças nas novas concessões ferroviárias e disse que hoje, por causa dos contratos celebrados durante o governo anterior, as metas são cumpridas apenas com a exploração de 38% da malha total concedida, o que estimula o baixo aproveitamento da infraestrutura. "Não mudamos os contratos juridicamente perfeitos", afirmou Dilma, esclarecendo que não serão rompidos, mas "alteramos os novos".

A ministra anunciou o adiamento de dois leilões de ferrovias: o prolongamento da Norte-Sul e a Leste-Oeste (de Ilhéus à divisa da Bahia com o Tocantins), ambos previstos para 2009. Mas ela explicou que os dois projetos, com investimento de R$ 11,2 bilhões no total, começarão a ser tocados com recursos orçamentários pela estatal Valec. Todas as demais concessões estão mantidas e essas ferrovias são "as únicas exceções", de acordo com Dilma – incluindo hidrelétricas como Belo Monte e mais rodovias.

A ministra prometeu "manter o PAC completamente sem cortes" e lembrou o caráter anticíclico do programa, dizendo que o governo está agindo para minimizar os efeitos da crise. Mas o aumento dos recursos previstos, de mais R$ 142,1 bilhões no período até 2010, reflete a contabilização no PAC de muitas obras e projetos que já haviam sido incluídos no programa. A maioria não foi iniciada e certamente terá impacto sobre o nível de atividade econômica, mas está longe de significar um reforço na taxa de investimento como resposta ao agravamento da crise, por estarem previstas há tempos.

No horizonte pós-2010, o aumento de valores do PAC se deve principalmente à inclusão dos projetos – que já constavam do recém-divulgado plano estratégico da Petrobras – de novas refinarias e de extração de petróleo na camada pré-sal. "Não incluímos a Petrobras no PAC (somente) agora", assinalou Dilma, defendendo a contabilização dos investimentos da estatal. A ministra frisou a intenção de "não exportar petróleo bruto, mas derivados e produtos petroquímicos". Pelas estimativas do governo, as principais descobertas no pré-sal – Tupi, Iara e Parque das Baleias – aumentaram de 80% a 100% as reservas brasileiras, em 11,5 bilhões a 15,5 bilhões de barris de petróleo equivalente.

A lista de obras e projetos que entraram no PAC após o agravamento da crise inclui duas novas concessões de rodovias (a BR-101, no Espírito Santo e na Bahia, e a BR-470, em Santa Catarina), duas novas usinas hidrelétricas (Davinópolis e Garibaldi, que somam 257 megawatts), ampliações de portos e expansão do programa de recuperação de estradas federais. "Queremos romper com a prática do tapa-buraco", disse Dilma, anunciando um passo mais ousado. A malha rodoviária terá mais 29,8 mil quilômetros de contratos do tipo Crema (com duração de cinco anos) ou PIR-IV (três anos), que são pagos mediante a manutenção do bom estado das estradas – modelo semelhante ao adotado recentemente para os portos.

Durante a coletiva de balanço do PAC, a ministra foi questionada por uma repórter italiana sobre a crise diplomática gerada pela concessão de asilo político ao militante de extrema-esquerda Cesare Battisti. Em um primeiro momento, afirmou que não responderia, já que a entrevista dizia respeito ao programa de investimentos. Depois, em uma decisão própria, resolveu responder a pergunta, afirmando que a decisão do Executivo envolvia uma "questão de soberania nacional", mas espera que ela não prejudique o "bom relacionamento histórico entre os dois países".

Na pesquisa CNT-Sensus, divulgada na terça, Dilma passou pela primeira vez a casa dos 10% das intenções de voto para a sucessão presidencial. Chegou a 13,4% na preferência do eleitorado, para substituir o presidente Lula. Ela continua atrás dos governadores de São Paulo, José Serra, e de Minas, Aécio Neves.